quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Eleições à parte... (e pela parte que me toca).



O Brasil envelhece a cada dia, mas pouca coisa muda de verdade nesta terra idolatrada. Desde criança ouço falar de políticos corruptos, de fraudes na previdência, outras tantas mazelas que infestam o nosso território. Mudam-se capitais, mudam-se as sedes do Governo, mudam-se os sistemas governamentais e o sistema monetário, mudam-se as leis e os seus códigos, mas nada disso consegue por fim aos desmandos dos governantes e seus subordinados que invariavelmente, colocam a população em situação de total abandono. Bem, chegamos a era “Lula” e estamos passando por uma nova fase onde o Brasil faz alarde para o seu inegável crescimento onde o pré-sal é parte importante. Os PACs e outros programas sociais tem feito a nossa sofrida população sonhar com um Brasil emergente e igualitário, mas será mesmo verdade que isto vai acontecer? Assistindo as campanhas eleitorais dos dois candidatos a presidência da república, onde a mentira, a falsidade e a hipocrisia graça por todos os lados, fica difícil acreditar numa mudança para melhor. E hoje faltando apenas dois dias para a eleição ainda encontro pessoas indecisas e desmotivadas devido o baixo nível em que a campanha foi apresentada povo. O duelo de difamações entre o candidato tucano e candidata do PT, vai ficar na história como uma das mais péssimas campanhas já presenciada pelo povo brasileiro. Entre tantas demandas e falta de decoro, fiquei com a impressão e porque não dizer a quase certeza de que a candidata do PV, Marina da Silva seria a única candidata ecologicamente correta. Fazer o quê? Votar em quem, mesmo? Na candidata protegida do presidente, ou no seu opositor? Em qual dos dois eu posso confiar? E depois das eleições quando o novo (a) presidente assumir, será que o caos da saúde acabará? E a segurança? Será que enfim vou me sentir segura? E quanto a educação de qualidade para os filhos do pobre? Será que se tornará realidade? Bem. O tempo nos dirá. E, pela parte que me toca, decidi não tomar parte. É isso. Esse ano pela primeira vez vou votar em branco e aguardar o resultado pela TV. Que a boa sorte acompanhe o nosso povo e que tenhamos um (a) presidente verdadeiramente comprometido com o Brasil! Espero que o meu desejo não se transforme em utopia, afinal o Brasil que sobrevive longe da orla também merece ser feliz.

sábado, 23 de outubro de 2010

A Briga dos Meus Pais_Quando o Racismo Começa em Casa


Tinha pouco mais de dois anos de idade. Era tarde da noite e não me recordo muito bem como foi que despertei. De repente me vi nos braços da minha mãe que corria em direção ao portão. Dentro de casa, o meu pai esbravejava e tomado de uma fúria que eu ainda não conhecia, atirava objetos como garrafas, pratos, copos e mais algumas tralhas na direção em que eu e minha mãe nos encontrávamos. Minha mãe, apesar do peso que carregava, esgueirava-se, ora daqui, ora dali (a escuridão a protegia) e ainda encontrava forças para atiçar ainda mais a raiva do meu pai, gritando:

—Joga mais para a direita! Essa não acertou! Agora passou raspando!...

Eu extremamente assustada com o que via chorava e pedia para que minha mãe me colocasse no chão. Nos meus dois anos e meio de idade, não entendia o que estava acontecendo e queria a todo o custo fugir dali. Minha mãe precisou me bater para que eu parasse de me mexer. Vi quando meu pai, tresloucado, pôs fogo numa pilha de pertences da minha mãe bem no meio da sala. O fogo cresceu rápido e eu senti mais medo ainda, pois meu pai estava dentro da casa. Fumaça e fagulhas começaram a sair por entre as telhas, e eu vi o rosto da minha mãe se transfigurar. O riso e o sarcasmo deram lugar ao desespero e ela começou a gritar desesperadamente:

—Socorro! Socorro! O homem está maluco! Está pondo fogo na casa!

O desespero no rosto da minha mãe denotava perigo. Eu me abraçava a ela e tentava esconder o rosto nos seus ombros. Não queria ver os seus olhos amedrontados. Ouvi as sirenes do carro dos bombeiros que os vizinhos haviam chamado. Vi quando eles entraram e trouxeram meu pai que estava em prantos. Aos pouco eles dominaram o incêndio e se foram. Vizinhos e curiosos se dispersaram. Eu ainda me lembro de quando entramos na casa. Os cacos e entulhos molhados e queimados jaziam na sala. Eu me dei conta de que várias fotografias, que de alguma maneira, representavam o passado de minha mãe e que antes enfeitavam o vidro da cristaleira haviam desaparecido no incêndio. Inclusive a foto do menino de cabelos loiros que a minha mãe dizia ser um dos seus filhos, já falecido. Depois fomos todos até a delegacia que por sorte ficava perto da nossa casa (aliás, passamos lá quase toda a noite). Eu dormia e acordava deitada num banco duro da delegacia, com a cabeça no colo da minha mãe. Meu pai ao que parece, prestava depoimento numa sala ao lado. O telefone preto preso à parede chamava a minha atenção e fazia com que por algumas vezes, me esquecesse do incidente. No entanto ao ouvir os gritos do delegado, e a voz surda e oprimida do meu pai, me dava conta de que o pesadelo ainda não havia terminado. O tempo passou sem que eu percebesse e logo era manhã e estávamos em casa. Só depois de alguns anos e de muitas indagações pude entender a causa daquele gesto insano do meu pai. Tudo aconteceu devido ao seu ciúme. Meu pai nunca aceitou o fato da minha mãe ter tido outro companheiro antes dele. Para piorar a situação ela trazia consigo fotos dos filhos que haviam morrido e nos momentos de discussão, gostava de atiçar o meu pai fazendo comparações entre ele que era de cor preta e o outro que era branco e Argentino e ainda se punha a reclamar da minha cor. A filha que havia puxado ao pai em tudo, até na cor! E se lamentava sempre com essas palavras:

—Meus filhos brancos Deus levou e deixou essa daí para pagar a minha língua!

Isso deixava meu pai irritado, pois minha mãe era mulata clara, quase branca e nunca disse a ele que não gostava de pretos. Só depois que eu nasci é que isso veio à tona. Sem outros argumentos ele se enfurecia e naquela noite exagerou. As brigas e discussões continuaram e agora com um agravante: não havia mais as fotos dos filhos brancos que eram o orgulho da minha mãe e ao mesmo tempo um motivo de vergonha para o meu pai. Cresci assim, discriminada dentro de casa pela minha própria mãe. O preconceito que sofri na rua doeu bem menos e me ajudou a crescer. Como águas passadas não movem moinhos, continuei minha vida e apesar das derrotas consegui ser feliz. Tive as mãos atadas pelo preconceito e pela discriminação, mas sobrevivi e hoje já não me importo quando uma ou outra pessoa tenta me diminuir por causa da minha cor, da minha idade ou da minha classe social. Sei que isso é parte da nossa cultura e tiro de letra sem me aborrecer ou me sentir ofendida. Tenho sempre em mente um provérbio que aprendi quando em criança: “Os cães ladram e caravana passa...” E vou em frente. Beijos a todos.

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

De irmandade e de irmãos


Nasci em Salvador, no Estado da Bahia nos idos anos de1948. Passei os meus primeiros anos de vida me dividindo entre os bairros da Cidade Nova, Pau Miúdo, Pero Vaz e mais tarde Cosme de Farias. Cresci entre meninos e meninas que brincavam de pique (picula) pelas ruas empoeiradas e se banhavam despidos, sem culpas e sem maldade nas fontes, nos  chafarizes e bicas das redondezas muitas vezes até os onze anos de idade ou até que a puberdade apontasse. Entre deveres e obrigações se destacava o respeito e a obediência aos mais velhos, não importando a idade do mesmo. Se uma menina se casasse aos treze anos (por exemplo), já era considerada uma senhora e nós, os menores, lhe devíamos respeito e obediência tanto quanto aos velhinhos de cabeça branca.
 Naquele tempo pude conhecer e conviver com vários tipos de “irmãos”.
Havia os irmãos de sangue – filhos do mesmo pai e da mesma mãe; os irmãos da parte do pai – filhos de mães diferentes, mas com um mesmo pai; os irmãos por parte de mãe – filhos de uma mesma mãe, mas com pais diferentes; os irmãos de criação – crianças que eram criadas por famílias diferentes da sua, mas que eram tratados como filhos; os irmãos de leite (ou de aleitamento) crianças que eram amamentadas por outra mulher e que eram consideradas por elas como seus filhos e os irmãos de consideração que era uma forma de amizade muito forte entre duas crianças sem nenhum parentesco. Esses vínculos normalmente perduravam por toda a vida e muitas vezes vi pessoas idosas se referindo com carinho aos seus irmãos sendo eles de sangue ou não. O que mais achava estranho era quando uma dessas pessoas me apresentava um outro idoso como sendo o seu irmão caçula. Ficava me perguntando: Como poderia ser o caçula se já era velho? Aos dez anos fui trazida para o Rio de Janeiro e encontrei uma cidade um pouco diferente da minha terra natal. No entanto, apesar do progresso e das novidades, os costumes das pessoas eram parecidos. O respeito aos idosos  e todos os valores morais eram defendidos pela grande maioria da população. Mas os costumes foram se modificando e sem que a gente se desse conta, a “modernidade”, o “estrangeirismo” e a televisão tomou conta de tudo. Abraçou-se o que era moda em outros países num prenúncio da Globalização. O casamento aos pouco foi se modificando e a família, ou melhor: o conceito de família foi adulterado se tornando um conceito vago de união e convivência (ou será conveniência?) entre pessoas. O conceito de irmandade sofreu uma brusca mudança e hoje, irmãos e irmãs muitas vezes se transformam em estranhos - ainda que sejam irmãos de sangue! Não posso deixar de lamentar a perda desses valores. Alguns dizem que foi bom e que isso torna as pessoas mais livres, mais conscientes e mais independentes. Pela parte que me toca e por tudo que vivi até aqui, posso afirmar que antigamente era muito melhor! Saudosista? Quem? Eu? Jamais! A Internet que o diga! Sou só mais uma, na multidão de envelhecentes que assola o país tentando viver e entender a vida como ela é.