Naquela
manhã, acordei bem. Era de natureza frágil e suscetível as doenças comuns das
crianças, por isso nem sempre tinha disposição para brincar. Depois do café,
sai e me pus a correr com um arco de borracha feito com um pedaço de pneu
velho. Na casa da frente havia um movimento estranho. Pessoas se aglomeravam na
porta num entra e sai sem fim. Eu observava afastada sem saber o que estava
acontecendo. Aos pouco fui vencida pela curiosidade e me aproximei. Por entre
frestas, pude ver que dentro da casa, pessoas choravam. No meio da sala havia
uma mesa coberta com um pano branco que ia até o chão e em cima desta mesa
havia um caixão de defunto. Eu estava acostumada a ver caixões nas lojas das
funerárias quando por lá passava acompanhada dos meus pais. Achava alguns feios
e outros bonitos. Esse que ali estava era roxo e feio. Eu ainda ia completar
quatro anos e não estava habituada com a morte. Enquanto olhava distraidamente
para dentro da casa, uma moça que estava do meu lado, me pegou pelo braço e
entrando na casa disse:
—Venha,
Luiza! Venha dar adeus a Dona Pombinha!
Antes
que eu soubesse o que estava acontecendo, a moça me suspendeu para que eu visse
o rosto da defunta. Inexplicavelmente o terror se apossou de mim e eu comecei a
gritar e a me debater com tanta força que a moça se viu forçada a me soltar.
Saí dali aliviada e confusa. Nunca entendi muito bem o porque daquele meu
comportamento, afinal, nem cheguei a ver as flores do caixão. Me aterrorizei
apenas com a proximidade do mesmo. A sensação de medo e desespero foi tão forte
que eu instintivamente passei a evitar tudo que se referisse a morte.